terça-feira, 20 de novembro de 2018

Vadia sim, vagabunda talvez...


Eu nunca a vi chorar, nem reclamar, nem falar mal de nada, era uma mulher sorridente que usava um decote de atitude, seu maior compromisso era consigo mesmo, se o tempo passava, ela não parava, nada podia pará-la, ninguém podia detê-la...
Nos seus lábios não cabiam palavras como: desconforto, desassossego, dúvida, especulação, angustia, trabalho forçado, nervoso, impaciência, desperdício, danos, perdas, preguiça, mesquinharia, informal, pejorativo... Machismo brasileiríssimo...
Quando ela tomava um café, começava sua magia, ela respirava fundo fazendo uma força descomunal, girava um dos dedos como varinha de cordão, sentia o cheiro gostoso de café, agradecia aos céus e a terra pela oportunidade, concentrava-se na xícara, não tomava café em copo, devagar se deliciava por poucos minutos com cada gota, com cada solução tomada, com cada gole, a beberagem faz efeito, e com isso, ela renovava assim suas energias e, logo, estava disposta para o trabalho...
Muitas vezes, ela dava-nos a impressão de querer contar tudo, pedia silêncio com um dos dedos, saia de si por um instante ou dois, com um olhar penetrante parecia nos conduzir para seu perto e para seu longe, e lá distante, pensativa, revia um pensamento, uma folha solta e como se descontroladamente chegava ao fim de sua história, quase no fim da narrativa mandávamos voltar para nossas funções...
Olhando da cozinha, eu vi nela uma descrição de Tigresa de Caetano Veloso: “Com alguns homens foi feliz, com outros foi mulher”...
Ela preparava o discurso, uma carta, um bilhete, um torpedo, acho que foi a primeira vez que a vi perder seu rebolado, ela resolveu pensar e pesar as palavras certas... As acepções certas de sua busca, quase no fim de um dicionário...
Não sei se quero continuar isto, as palavras estavam quietas por demais, o silêncio passou de dois instantes, o silêncio invadia tudo, uma aflição crescia, seus sofrimentos me alcançavam, faltavam palavras, ela terminou dizendo:
- Vadia é quem sem se prostitui, leva uma vida amoral ou devassa... Vagabunda é igual à vadia, diferente de rapaliga... Vamos tomar um café, esquecer estas besteiras de uma vez, um amante pode virar um amigo, mas um amigo nunca pode virar um amante...



Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social


sábado, 10 de novembro de 2018

Pressão Alta


Quando eu tinha dez anos de idade, minha pressão era onze por sete. Quando completei vinte anos, minha pressão era doze por oito. Atualmente, antes dos quarenta anos de idade, minha pressão oscila muito para manter os treze por nove...
Será que quando eu chegar aos oitenta anos, minha pressão ficaria sem remédio entre dezoito e quatorze?
Para mudar tudo isso, a pressão alta, devo manter a calma, não fumar, não beber álcool, preciso voltar a fazer exercícios físicos, me alimentar bem, dormir bem, cortar o sal da alimentação, evitar doces e frituras... Blá, blá, blá...
Vamos ao momento revelação do texto: quando eu era criança, eu não tive piolho...
Encara essa verdade é muito difícil, sempre ali do meu lado, eu já estava acostumado com as lambidas da morte: gordura abdominal, calvície, secura da pele...

Na verdade, estou no jogo ainda, sem piolhos, voltei pro jogo, ouvindo os conselhos da morte para viver mais, mais e mais... Sem a pena de ninguém, pra frente é que se anda, agora com um novo sentido...


Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

12 de Outubro - Dia da Padroeira do Brasil: Nossa Senhora Aparecida

JOANNA - A PADROEIRA
(Composição: Ronaldo Monteiro de Souza)

Ó, virgem santa,
Rogai por nós, pecadores
Junto a Deus Pai
E livrai-nos do mal e das dores

Que todo homem caminhe
Tocado pela fé
Crendo na graça divina
Esteja como estiver

Abençoai
Nossas casas, as águas,
As matas e o pão nosso
A luz de toda manhã,
O amor sobre o ódio

Iluminai
A cabeça dos homens,
Te pedimos agora
E que o bem aconteça
Nossa Senhora



quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Uma história de Aparecida

Era setembro de 1717, um velho cigano entrou com o barco no Rio Paraíba do Sul, rapidamente jogou duas partes da santa nas águas e partiu como manda sua tradição.
Um mês depois, desesperados três pescadores foram cumprir seu fardo, trazer peixes-peixes, peixões e mais peixes para a festa que a Vila de Santo Antônio de Guarantinguetá iria oferecer ao seu governante que estava de passagem pela região.
Era primavera e época ruim de cardume, não era tempo de peixe naquele mês...
Após várias tentativas, surgiu do Rio, na rede, um pedaço de uma imagem de Nossa Senhora...
Surpresos, ansiosos, curiosos, os pescadores lançaram a rede mais uma vez e recolheram a cabeça da imagem, que se encaixou perfeitamente ao corpo.
Eles colocaram a imagem da santa no barco. E depois disso,  os peixões, peixes e mais peixes começaram a aparecer, pular na rede, com abundancia e fartura, tão grande que quase fez o barco virar, segundo os relatos históricos da tradição católica.
Foi assim que aprendi e assim que conto, reconto, escrevo, reescrevo as novas gerações, um milagre após milagre, um dia após o outro...
Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Psicopata

Não sei exatamente quando comecei as palestras para jovens e adultos, pois sempre ganhei suficientemente bem no consultório atendendo casais, donos de pequenas empresas e, principalmente, chefes de família...
Eu acredito que ainda cursando psicologia, eu achava importante o serviço assistencial como forma de propaganda, marketing pessoal, interpessoal ou transpessoal, enfim, "dar aos pobres e emprestar para Deus". "São todas estas palavras que as pessoas usam sem nenhum significado preciso".
Nunca acreditei que todas pessoas tem tendências criminais, passionais ou impulsionais, segundo a Classificação Internacional de Doenças (CID-10), o termo oficial para designar um psicopata ou sociopata é personalidade antissocial ou dissocial... Historicamente é tudo muito confuso.
Sempre fugi dessas polêmicas, no meu amago, no mais profundo dele e da minha mente racional nada emocional, eu sabia que tocar nesses temas em palestras ou entrevistas podia gerar perdas irreparáveis. Talvez assim eu controlava meu ego... Mais chega um tempo que você não pode mais fugir... Eu era um rebelde aparente.
Eu gostava de definir os crimes como na Idade Média: nato, louco, ocasional, habitual e passional. Que o criminoso é apenas uma pessoa normal nervosa! Usando esse critério, seria muito fácil diagnosticar incorretamente a pobre pessoa, tipos de razões, incluindo crimes passionais, como amor ou ciúme...
Até que em uma madrugada, dessas que você não dorme, dessas que se tem insonia, por voltas das três da manhã, alguém te liga é diz calmamente: "sociopatia é quando o criminoso mata o sócio, psicopatia é quando a gente mata o psicologo"...
Por alguns instantes, não entendi a ameaça, não quis entender, não desejei expor minha fragilidade. "São todas estas palavras que as pessoas usam sem nenhum significado preciso". Foi abduzido de meu discernimento e resolvi comer algo, beber algo, já tremia nervosamente, já que não sentia a vontade pra perdoar meus pecados nem pra confessar minhas virtudes, estava só, me sentia abandonado...
Surgiu uma luz no fim do túnel, psicopatas fanáticos, ou sádicos, ou passionais, não procuram médicos, respirei aliviado por alguns minutos, até que lembrei que eu não sou médico, estava desprotegido na minha casa, eu era psicologo e podia ser a próxima vítima, porque resolvi falar a diferença entre sociopata e psicopata no dia anterior e para tanta gente, eu podia ter escrito algo inteligente, usando de artifícios, subterfúgios, um pseudônimo, qualquer coisa que não causasse esse tipo de dor, descontrole alheio, agora o sol demorava a nascer, na cidade não se ouve galos cantar anunciando a Aurora e o medo mais uma vez constrangia. Onde posso me esconder? Mas até quando? Resolvi chorar, eu não tinha testamento, eu sou jovem, sempre se é jovem demais...

Jorge Barboza

Escritor e Colunista Social

quinta-feira, 9 de agosto de 2018

terça-feira, 10 de julho de 2018

O dia que o IPOD parou


O celular não facilita muito a nossa vida diária. Ele assumiu parte de nossa memória com suas funções básicas, ou seja, ferramentas fantásticas: ligações rápidas, mensagens curtas, longa agenda de contatos, lista de tarefas, galeria de imagens, coletânea de músicas, rádio, email, pagamentos online, pesquisas comerciais, entretenimento e diversas possibilidades. Mas como tudo na vida apresenta muita alegria com toques de futilidade, dependendo do uso que fazemos de tudo, desafios e consequências que a revolução tecnológica da informação implementou, inclusive enfermidades para as pessoas que não a usam com bom senso...
Isto acontece quando as pessoas acordam e dormem com o celular, dormem e acordam, não dormem, não sonham, não acordam, não comem, não bebem sem administrar um dispositivo eletrônico móvel, se deixam envolver além da conta, sem estabelecer limites, bem como deixam de viver as possibilidades de uma vida humana para mergulhar em uma fantasia ou inverdade. Sendo assim, sentem-se mais motivados com seus aparelhos inorgânicos do que com as pessoas. Temos que escolher em utilizar a tecnologia a nosso favor, sem nos tornarmos escravos dela, vivendo em família, entre amigos, com colegas de trabalho, em uma comunidade cheia de pessoas, em um comercio cheio de funcionários, em uma empresa com muitos profissionais, em uma escola com alunos e professores no processo de ensino-aprendizagem, um dia de cada vez...
Gostaria de ressaltar acerca dos smartphones que, recentemente, fiquei 15 dias parcialmente sem o meu. Passei muitos apuros, desde não atender ligações pessoais, como também profissionais, pois não conseguia identifica-las no horário comercial, ou seja, não sabia quem estava ligando e, portanto, não dei a devida validade a seus respectivos atendimentos... Outro problema, foram os alarmes que tocavam completamente atrasados, pois a data e a hora resolveram se adiantar espontaneamente, e “relógio que adianta não atrasa”, e vice-versa. Por fim não foi vírus, mas tive que fazer um upgrade, ou seja, trocar o mesmo por um aparelho móvel mais atual.
Venci o tédio e nomofobia, sem prejuízo financeiro, comercial, e acadêmico com atividades cotidianas e laborais, mas não desejo isso nem pra meu pior inimigo, brincadeirinha, as relações sociais e familiares estão voltando a fluxo, e não estou usando de terapia para isso.
Jorge Barboza

Escritor e Colunista Social

sexta-feira, 20 de abril de 2018

Inimigas


Não posso deixar de registrar aqui que sou grato as minhas Inimigas, pois elas não têm dedos para me falar maldades nem falsas verdades, sem elas não há história, ou seja, conflito que renda uma boa história:



"Já tive Inimigas de todas as cores

De várias idades de pouco ódio
Com umas até certo tempo briguei
Pra outras apenas um pouco me dei

Já tive Inimigas do tipo atrevida

Do tipo acanhada, do tipo vivida
Casada carente, solteirona infeliz
Já tive Inimigas donzelas e até meretrizes

Inimigas burras e desequilibradas

Inimigas confusas, de guerra e de fofoca
Mas nenhuma delas me fez tão fugaz como você me faz

Procurei em todas as Inimigas a vingança

Mas eu não encontrei e fiquei mais forte
Foi começando mal, mas tudo teve um fim
Você é o eclipse da minha vida a minha falta de boa vontade
Você não é verdade você é mentira
É tudo que ninguém quis pra mim"...


Jorge Barboza
Colunista Social. Escritor. Revisor

quinta-feira, 19 de abril de 2018

19 de Abril - Dia do Índio

"Procure conhecer-se, por si próprio. Não permita que outros façam seu caminho por você. É sua estrada, e somente sua. Outros podem andar ao seu lado, mas ninguém pode andar por você" (Art. 3° do Código de Ética do Índio Norte-americano).

segunda-feira, 2 de abril de 2018

A princesa Autista



            Muitos anos atrás quando ainda não se falava em reciclar e em ecologia, havia um reino pacato que sua constituição prezava com descontos de impostos a reutilizar os materiais variados. Para dar exemplo, sua rainha fez atrás do seu trono uma linda nave de garrafas coloridas de vidro e assim começa nossa saga...
            Ao colocar a última garrafa verde em sua nave, a rainha sentiu surgir um aroma doce, suave, bom, agradável, delicado como um vinho maduro, gostoso, saboroso de uvas recém colhidas, juntas lentamente, quase amassadas no início da confecção do mais famoso vinho de sua principal adega...
            Meses a fio esperava por este espetáculo vitral que coincidiu com o parto de sua filha, a princesa autista, linda como só ela...
            Aos cinco anos de idade, a princesinha ouvia um miado, uma campainha, um latido ou qualquer som absolutamente distante ficava parada, pensando, lendo, digerindo, devorando, degustando os sons juntos ou separados até bater palmas e colocar todos os sons nas suas ideias e, consequentemente, no lugar na sua mente...
            Aos sete anos, ela ficava por horas sem piscar, sem pestanejar, sem reclamar, sem fazer ruídos, sem espasmos, compenetrada nos rodomoinhos e espirais dos modernos arranjos do castelo quase velho...
            Com quinze, a princesa não quis baile nem festa, nem recital, queria pintar tudo: portas, maçanetas, janelas, salas, quartos, banheiros, cozinhas, jardins, tudo que via por perto do castelo.
            Com certeza não havia tempo ruim, pois todo dia era um dia bom para Princesa Autista guardar, colher, mostrar, recolher, reconhecer, desenhar, costurar, rasgar, viver, morrer, para se reinventar sem algazarras, sem guerras, só pelo simples prazer de fazer o bem sem importar com quem e como...

Jorge Barboza
Escritor. Colunista Social.

terça-feira, 20 de março de 2018

A princesa Down



            Vou começar contando como aprendi a contar historietas com uma menina riquíssima, branca, magrinha, de olhos verdes e fala mansa. Ela contava assim:
            “Era uma vez uma menina rica, que morava em uma mansão rica, com sua mãe rica, seu pai rico, sua empregada rica e seu cachorro rico”.
            “Era uma vez uma menina pobre, que morava em uma mansão pobre, com sua mãe pobre, seu pai pobre, sua empregada pobre e seu cachorro pobre”.
            Acredito que era seu melhor recurso para entender e explicar a vida e, por isso, em sua homenagem resolvi escrever o seguinte:
            Era uma vez uma menina feliz, uma princesa com síndrome de down, que vivia, sonhava e esperava por um grande amor. Um amor diferente que dava borboletas no estomago, mãos suadas, perda de apetite, aceleração no peito, rosto enrubescido... Um amor diferente do que recebia de sua mãe e de seu pai.
            A princesa não tinha servos, escravos ou empregados, mas era cercada de amigos inseparáveis. Sua nobreza não tinha doutores, enfermeiros ou professores, mas era abençoada por cuidadores e mentores.
            Uma tarde, ela furou o dedo em uma roca, doeu muito, porém a princesa não morreu nem dormiu um sono de cem anos.
            Na sua decima quinta lua, durante o baile, conheceu um monstro e não se apaixonou, não se perdeu nem enviada para longe de tudo, resistiu e continuo vivendo, sonhando e esperando o grande amor, que pode estar aqui, ali, lá, lá, à espreita ou ao mar.


Jorge Barboza
Colunista social. Escritor. Revisor

sábado, 10 de março de 2018

Boas Cercas



            Quando recentemente ouvi essa expressão “boas cercas fazem bons vizinhos”, achei que havia não compreendido. Depois, reconheci que seu significado era muito profundo. Por alguns instantes ainda balancei com o que diz nossa cultura: “amigos, amigos, negócios á parte”.
Com certeza não misturar os negócios e as amizades seria um ideal de vida, mas passamos mais de quatro horas trabalhando e, consequentemente, estabelecendo relações intrapessoais e extras pessoais curtas ou duradouras para “as cercas” de forma clara e, assim, evitar que os limites também não sejam desrespeitados.
Mas como estabelecer as cercas saudáveis, ou seja, os limites quando é inevitável a combinação amizade e negócios?
Acredito que seja uma aprendizagem para a vida toda. Aprendi que os limites devem ser estabelecidos no início das relações, continuado progressivamente, e jamais esquecidos com a interação fora e dentro das empresas.
A comunicação em todos os casos é essencialmente, não existe a possibilidade de conhecermos nossos valores, nossa ética e nossos limites sem apresenta-los. Se não reconhecemos os limites, como iremos estabelecê-los?
E, muitas vezes, se não estamos conscientes desta prática ética não percebemos o desrespeito e, depois, só depois consertamos os muros...
Como as pessoas costumam dizer “devemos fazer aos outros, o que gostaríamos que fizessem pela gente” – simplesmente porque somos todos diferentes. A honestidade deve ser nossa bussola para todos os aspectos das nossas vidas. Não funciona tratar todos os funcionários de forma igual, assim como não funciona tratar os amigos e até os filhos de forma idêntica...
Da mesma forma, temos a opção de afastar aquelas relações que não nos fazem bem e aprender a amar essas pessoas à distância. Muitas vezes, o afastamento é a opção mais ética que temos de libertá-las e nos libertar de relações em que todos saem perdendo.
Comunicar educadamente e respeitosamente é ainda o melhor procedimento para manter “boas cercas” e estabelecer “bons vizinhos”.

Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social


terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Zagro


Pior que o mal iminente é a morte súbita. Ele não podia perder mais tempo, já havia muitos mortos. Quantos mais seriam necessários para por fim ou para por começo?
O final é o inicio? O principio é outro fim? As metades que se completam ou completos que se dividem?
Zagro já tinha 54 anos, os cabelos e barbas prateavam, enquanto os braços e as pernas dobravam em curvas fortes, firmes e mágicas. Tantas batalhas, vitórias e derrotas. Aquela escolha era oportunidade para SettaS, o planeta renasceria, pararia congelado por anos e depois borbulharia ao derreter-se, queimar-se e incinerar-se. Seus diferentes habitantes não seriam consumidos ou extintos. E bem que, os Monstros Malévolos nos últimos nove dias haviam descoberto uma formula de se remontarem e assim perpetuarem suas vidas e maldades. Eles se  uniam estranhamente e formalmente: dois semimortos, dois quase vivos, dois mortos-vivos, se grudavam, se misturavam, se costuravam, se colavam e assim se tornavam uma criatura pior, nova, maior de monstruosidade.
Zagro temia que o surgimento dessa nova besta pudesse permitir outros processos idênticos, semelhantes, paercidos, ou seja, a junção de quatro semimortos, quatro quase vivos, quatro mortos-vivos. E depois: oito, dezesseis...
Até aquele momento ele sabia que havia quatro poderosos Monstros Malévolos, quatro chefões Monstros Malévolos, quatro maiorais Monstros Malévolos e suas hordas tinham diminuindo um quinto sendo consumidos por uma raça inteira de settasianos.
Zagro parou de pensar e foi à fronte da batalha, mandou que seus três pupilos levassem para bem longe seus iguais, seus semelhantes, seus replicantes. Ordenou que Dragão, Pégaso e Fênix ensina-se o que sabiam para todos, pois ele não estaria mais entre eles em breve e de fora do mundo, que conheciam, viriam alienígenas conquistadores que colocariam fim a paz, mas também viriam alienígenas conciliadores para definitivamente terminar com sua obra pela paz.
 Nesse instante os quatro poderosos Monstros Malévolos, os quatro chefões Monstros Malévolos, os quatro maiorais Monstros Malévolos mandaram sua horda terminar o que eles não podiam e as bestas cercaram Zagro, engoliram Zagro, fecharam Zagro, como um eclipse que apaga totalmente o sol por algum tempo determinado e houve um silencio enorme, as nuvens pararam, os settassianos sentiram medo, pavor, um mal pressagio, lagrimas começaram a brotar, gemidos, mãos fechando as bocas fortemente...
Uma explosão acabou com as dúvidas, muitos monstros tentavam correr, se esconder, se proteger, se livrar...
O frio levantou-se como raízes, buscando tudo, foi tornando tudo gelo cristalino, branco, alvo, cândido, tão rápido que parecia uma avalanche subindo as florestas, os rios, as cachoeiras e as montanhas, ao contrário de descer...
Os Quatro poderosos Monstros Malévolos, os quatro chefões Monstros Malévolos, os quatro maiorais Monstros Malévolos se prenderam ao chão formando com seus corpos caixões preto, escuro e duro. Metade do planeta acabou congelado e a horda de bestas foi extinta definitivamente.

O corpo de Zagro não foi encontrado até hoje, alguém disse que de seu sacrifício criaram-se sete ou seis esferas de poder. Três estão com seus pupilos e as demais foram em busca de alienígenas conciliadores.
Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social



quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

A árvore que florescia no Carnaval


            Eram romper os tambores no Sambódromo do Anhembi que a bela rosa ipê florescia, caia de seus galhos todas as folhas e nasciam flores. Diferente das árvores de sua espécie que florescem no fim do inverno, entre os meses de julho e agosto.
            Sua madeira dura e resistente é símbolo do Brasil e do bairro que mora, pois cresceu devagar até seus oito metros de altura. Sortuda nunca foi escolhida para construção civil e naval: assoalhos, eixos de rodas, peças de marcenaria, vigas...
            Provavelmente, a bela rosa ipê foi abençoada por “um anjo torto desses que vive nas sombras disse”: madeira de qualidade, árvore de casca dura, suas flores serão lindas, de geração a geração de paulistanos, pois embeleza as ruas de coração e protege os amantes do sol, da chuva, do vento e da lua. Não evita novos rebentos de novembro, mas colore de rosa os menos afoitos e depravados. “Se nossas linhas não fossem tão tortas não teriam se cruzado”.
            Chegando a quarta de cinzas, o ipê cantava triste e baixo:
“Adeus, adeus
Meu pandeiro do samba
Tamborim de Samba
Já é de madrugada

Vou-me embora chorando
Com meu coração sorrindo” [...]

A bela rosa ipê deixava assim cair suas flores para uma vizinha aparecer em roxo: a quaresmeira.
            Sonharia com o próximo Carnaval por meses frios e quentes, quinzenas úmidas e secas, dias cheirosos e fedidos, criando novas folhas e quase sumindo entre carros e arranha-céus, junto no seu pano de guardar confetes as mais belas formas rosas de flores, pois esta planta fêmea de ipê não morria durante o ano, cantava com calma sua sina:
            “Não deixe o samba morrer
            Não deixa o samba se acabar
            O morro foi feito de samba
            De samba pra gente sambar

            Quando eu não puder mais entrar na avenida
            Quando as minhas pernas não puderem aguentar
            Levar meu corpo, junto com meu samba” [...]

 E como sempre, diferentes de outras plantas de sua espécie, florescia rosada durante os primeiros aplausos do desfile da primeira escola de samba de São Paulo no Sambódromo, deliciando-se por mais quatro noites apaixonantes...

Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social


quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Meu novo livro!

Antes disso havia um “Tempo da Graça”, de 15 a 30 dias na prisão, onde se prometia para todos os transgressores nada de açoitamentos, cortes, torturas, pedradas e similares formas de retaliação para definitiva confissão de pecados a Santa Igreja.
Antes da Inquisição Espanhola que marca o fim do Mercantilismo, era antiga, e surgimento de um novo sistema econômico: o Capitalismo. Duras penas levam as mulheres ao fogo: ao inferno na terra. Quem acredita em julgamento final não quer ter seus segredos escancarados ao Santo Ofício, a condenação é certa.
O sistema de indulgencias está arruinado para sempre e os paranormais começam agir nas estradas antecipando o bem e o mal que povoam terras e igrejas distantes, começam assim as articulações divinas, os homens mais uma vez são marionetes...

A fuga do reino espanhol não é mais suficiente, é necessária para cruzar o oceano com vida, sem escravidão, e chegar ao Novo Mundo: o Paraíso Perdido...

sábado, 20 de janeiro de 2018

Nu


           Infelizmente o nu chegou aos redores de nossos museus.
Você deve estar se perguntando: Não existem estatuas e pinturas de nu artísticos dentro dos maiores e menores acervos nacionais e internacionais de Belas Artes pelo Mundo?
Sim, há. Mas o que vou relatar não se trata de uma imagem parada ou estática em gesso, madeira, cerejeira, garapeira, pinho, cedrinho, cerâmica, argila, terracota, reboco, taipa de pilão, pau-a-pique, terra crua, metal, bronze, ouro, prata, chumbo, aço, cimento, granito, mármore, pedra sabão...
Estava tirando fotos da Catedral da Sé, em minha última excursão ao Caixa Cultural, de uma de suas magistrais janelas do sexto andar, quando vi em um dos quartos do hotel amarelo em frente ao espaço cultural, um casal nu!
Não era amor, nem sexo, era um casal nu pousando para fotos na cama, na poltrona, no chão, no parapeito da janela do hotel...
Eles não tinham noção dos olhares de fora, exatamente, do Caixa Cultural... Houve um burburinho entre outros visitantes da exposição, seguranças correndo fechando as cortinas, que davam margens ao espetáculo nu, um monte de explicações desconexas, rostos corados, muitas hipóteses, risadinhas, muito falatório, gargalhadas, muitas dúvidas, por fim, minha visita acabou antes do que eu esperava, não estava mais interessado na mostra.
As sombras tomaram o andar como se nu fosse o inimigo, proibido, perigoso, as obras do Museu da Caixa estava envergonhado, constrangido, tímido, preocupado, eu estava com as obras, mas de outro lado sereno, tranquilo, a vontade com roupa, do que vi e entendi, blá blá blá, eu cansei das cortinas fechadas, das pessoas falando, será que as pessoas não entendiam mais nada e o nu assumiu tudo?
Passei as mãos na cabeça, desci o elevador, balbuciei algo a assessorista do elevador, pedi minhas coisas a recepcionista na chapelaria, carimbos nos folders, corri para fora, para o metrô, para longe, finalmente acabei com as tormentas, os rumores e o nu tomou a proporção que devia ter, um momento de intimidade longe de tantos olhares e tantas bocas, um filme que se escolhe assistir, uma revista que se deseja rever, um local gostoso como o desejo...


Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social


quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Quebrante ou Quebranto


Rezar três vezes:
Com dois puseram
Com três eu tiro.
Com o nome do Pai,
Do Filho e do Espírito Santo,
Sai quebranto! (ORTENCIO, 1997, p. 229).

Segundo meu sobrinho e afilhado, quebrante é um malogro que se faz as meninas enquanto o quebranto é um mau-olhado feito aos meninos.
Quebranto é um estado de torpor, cansaço, languidez, quebrantamento; segundo o Dicionário Houaiss da língua portuguesa, suposta influência maléfica de feitiço, por encantamento à distância. Efeito malévolo, segundo a crendice popular, que a atitude, ou seja, o olhar de algumas pessoas produz em outras, principalmente, em recém-nascidos, bebês de colo ou crianças de modo geral...
Se todos são capazes de produzir essas energias negativas ou positivas, todos também podem ser protagonistas da expansão ou expulsão destes tipos de energias...
Desfalecimento, prostração, quebramento de corpo eram registros deste fenômeno nos antigos dicionários portugueses.
Na Grécia existe, inclusive, o famoso olho grego, um talismã contra a inveja e o mau-olhado, que funciona também como um símbolo da sorte e é um poderoso instrumento contra energias negativas. Atualmente é feito de vidro, na cor azul, sendo usado como pingentes em pulseira, colares e chaveiros.
Universalmente, o mau-olhado é conhecido como mal de ojo, na Espanha; mal-occhio, para os italianos; evil eye para os ingleses e mati, para os gregos. No Brasil, considera-se quebranto quando afeta o ser humano e mau-olhado quando afeta plantas e animais...
São diversos os sintomas de quem é vítima do quebranto: olhos lacrimejantes, moleza por todo o corpo, tristeza, bocejar constante, espirros repetidos, inapetência. No caso dos animais, ficam tristes, parados e encorujados. As plantas vítimas de mau-olhado murcham sem motivo e rapidamente, às vezes da noite para o dia ou vice-versa, dependendo de quando foram atingidas pelas irradiações maléficas.
Seja quebranto, quebrante ou mau-olhado, segundo a crença popular, nem sempre ele vem de alguém invejoso. Aliás, o quebranto mais difícil de cortar provém de não invejosos. É preciso benzer com um galhinho de arruda, por três, sete ou até nove dias seguidos, acredite se quiser...

Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social





Referências


ARAÚJO, Alceu Maynard. Quebranto. In: ______. Medicina rústica. 3. ed. São Paulo: Comp. Ed. Nacional, 1979.

CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do folclore brasileiro. 11. ed. rev. e atual.  São Paulo: Global, 2002. 

GASPAR, Lúcia. Quebranto e mau-olhado. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/>. Acesso em: 31 dez. 2017.

OLHO Gordo, Mau Olhado e Quebranto, o que é e quais são os sintomas. Disponível em: <http://bomfeiticeiro.com/simpatias-feiticos-medalhas-cruzes-talismas-amuletos-de-protecao-magia-contra-feiticos/olho-gordo-mau-olhado-inveja-quebranto/>. Acesso em: 17 abr. 2013.

ORTENCIO, Bariani. Medicina popular do Centro-Oeste. 2. ed.  rev. e atual. Brasília, DF: Thesaurus, 1997.  

REZAS, benzeduras, simpatias: soluções para todos os seus males. São Paulo: Editora Três [19--?].