terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Zagro


Pior que o mal iminente é a morte súbita. Ele não podia perder mais tempo, já havia muitos mortos. Quantos mais seriam necessários para por fim ou para por começo?
O final é o inicio? O principio é outro fim? As metades que se completam ou completos que se dividem?
Zagro já tinha 54 anos, os cabelos e barbas prateavam, enquanto os braços e as pernas dobravam em curvas fortes, firmes e mágicas. Tantas batalhas, vitórias e derrotas. Aquela escolha era oportunidade para SettaS, o planeta renasceria, pararia congelado por anos e depois borbulharia ao derreter-se, queimar-se e incinerar-se. Seus diferentes habitantes não seriam consumidos ou extintos. E bem que, os Monstros Malévolos nos últimos nove dias haviam descoberto uma formula de se remontarem e assim perpetuarem suas vidas e maldades. Eles se  uniam estranhamente e formalmente: dois semimortos, dois quase vivos, dois mortos-vivos, se grudavam, se misturavam, se costuravam, se colavam e assim se tornavam uma criatura pior, nova, maior de monstruosidade.
Zagro temia que o surgimento dessa nova besta pudesse permitir outros processos idênticos, semelhantes, paercidos, ou seja, a junção de quatro semimortos, quatro quase vivos, quatro mortos-vivos. E depois: oito, dezesseis...
Até aquele momento ele sabia que havia quatro poderosos Monstros Malévolos, quatro chefões Monstros Malévolos, quatro maiorais Monstros Malévolos e suas hordas tinham diminuindo um quinto sendo consumidos por uma raça inteira de settasianos.
Zagro parou de pensar e foi à fronte da batalha, mandou que seus três pupilos levassem para bem longe seus iguais, seus semelhantes, seus replicantes. Ordenou que Dragão, Pégaso e Fênix ensina-se o que sabiam para todos, pois ele não estaria mais entre eles em breve e de fora do mundo, que conheciam, viriam alienígenas conquistadores que colocariam fim a paz, mas também viriam alienígenas conciliadores para definitivamente terminar com sua obra pela paz.
 Nesse instante os quatro poderosos Monstros Malévolos, os quatro chefões Monstros Malévolos, os quatro maiorais Monstros Malévolos mandaram sua horda terminar o que eles não podiam e as bestas cercaram Zagro, engoliram Zagro, fecharam Zagro, como um eclipse que apaga totalmente o sol por algum tempo determinado e houve um silencio enorme, as nuvens pararam, os settassianos sentiram medo, pavor, um mal pressagio, lagrimas começaram a brotar, gemidos, mãos fechando as bocas fortemente...
Uma explosão acabou com as dúvidas, muitos monstros tentavam correr, se esconder, se proteger, se livrar...
O frio levantou-se como raízes, buscando tudo, foi tornando tudo gelo cristalino, branco, alvo, cândido, tão rápido que parecia uma avalanche subindo as florestas, os rios, as cachoeiras e as montanhas, ao contrário de descer...
Os Quatro poderosos Monstros Malévolos, os quatro chefões Monstros Malévolos, os quatro maiorais Monstros Malévolos se prenderam ao chão formando com seus corpos caixões preto, escuro e duro. Metade do planeta acabou congelado e a horda de bestas foi extinta definitivamente.

O corpo de Zagro não foi encontrado até hoje, alguém disse que de seu sacrifício criaram-se sete ou seis esferas de poder. Três estão com seus pupilos e as demais foram em busca de alienígenas conciliadores.
Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social



quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

A árvore que florescia no Carnaval


            Eram romper os tambores no Sambódromo do Anhembi que a bela rosa ipê florescia, caia de seus galhos todas as folhas e nasciam flores. Diferente das árvores de sua espécie que florescem no fim do inverno, entre os meses de julho e agosto.
            Sua madeira dura e resistente é símbolo do Brasil e do bairro que mora, pois cresceu devagar até seus oito metros de altura. Sortuda nunca foi escolhida para construção civil e naval: assoalhos, eixos de rodas, peças de marcenaria, vigas...
            Provavelmente, a bela rosa ipê foi abençoada por “um anjo torto desses que vive nas sombras disse”: madeira de qualidade, árvore de casca dura, suas flores serão lindas, de geração a geração de paulistanos, pois embeleza as ruas de coração e protege os amantes do sol, da chuva, do vento e da lua. Não evita novos rebentos de novembro, mas colore de rosa os menos afoitos e depravados. “Se nossas linhas não fossem tão tortas não teriam se cruzado”.
            Chegando a quarta de cinzas, o ipê cantava triste e baixo:
“Adeus, adeus
Meu pandeiro do samba
Tamborim de Samba
Já é de madrugada

Vou-me embora chorando
Com meu coração sorrindo” [...]

A bela rosa ipê deixava assim cair suas flores para uma vizinha aparecer em roxo: a quaresmeira.
            Sonharia com o próximo Carnaval por meses frios e quentes, quinzenas úmidas e secas, dias cheirosos e fedidos, criando novas folhas e quase sumindo entre carros e arranha-céus, junto no seu pano de guardar confetes as mais belas formas rosas de flores, pois esta planta fêmea de ipê não morria durante o ano, cantava com calma sua sina:
            “Não deixe o samba morrer
            Não deixa o samba se acabar
            O morro foi feito de samba
            De samba pra gente sambar

            Quando eu não puder mais entrar na avenida
            Quando as minhas pernas não puderem aguentar
            Levar meu corpo, junto com meu samba” [...]

 E como sempre, diferentes de outras plantas de sua espécie, florescia rosada durante os primeiros aplausos do desfile da primeira escola de samba de São Paulo no Sambódromo, deliciando-se por mais quatro noites apaixonantes...

Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social